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quarta-feira, 11 de novembro de 2009

RIO DE JANEIRO, 11 DE NOVEMBRO DE 2001: EPÍSTOLA AOS HOMENS DO FUTURO

NEUZA MACHADO

EPÍSTOLA AOS HOMENS DO FUTURO

NEUZA MACHADO


RIO DE JANEIRO, 11 DE NOVEMBRO DE 2001


Ao iniciar esta minha cartinha, com as notícias de hoje, dia 11 de novembro de 2001, desejo que esta os encontre repletos de saúde e riquezas fabulosas. Que o Futuro-Sem-Muro aí de vocês seja um lugar de paz, tranqüilidade e harmonia, incluindo a permanente abundância de alegrias espontâneas e felicidades autênticas.

As notícias de meu tempo não são boas. A semana transcorreu quomodo o já esperado. Nós brasileses, neste mês de Novembro do anno inicial do Terceiro Milênio, não estamos guerreando, mas as Guerras insolúveis de outros povos do Mundo nos envolvem inexoravelmente. A incrível Máquina Internet nos mostra todos os acontecimentos do Globo Terrestre – todas as guerrilhas que acontecem nas diversas regiões de nosso Planeta – no mesmíssimo instante do ocorrido. Ontem mesmo caiu um helicóptero na África (pesquisem!), em uma localidade da África, e a humanidade toda recebeu a notícia uns segundinhos depois, inclusive [nós] os brasileses, habitantes de uma região paradisíaca, bela e agradável, incrustada no Espaço de Fogo do Orbe Guerreiro. É bem verdade que o nosso Paraíso não se parece nem um pouco com o Paraíso Celestial das Profecias Religiosas, aquelas inúmeras profecias que acompanharam a humanidade, desde o princípio do Mundo até este meu insólito momento. Muitas manchas negras e nuvens escuras poluem a nossa atmosfera, que deveria ser, sem nenhuma dúvida, de uma pureza celestial, já que nos consideramos os privilegiados de Deus. Saibam vocês, meus Amigos do Futuro, que a frase mais propalada aqui no meu país, neste meu tempo de incertezas, é esta: Deus é brasilês! Realmente, somos um povo feliz. Não há inflação declarada (assim afirmam os economistas); a economia se mantém estabilizada (assim afirmam nossas autoridades competentes); uma parte do povo se alimenta bem (uma pequena parte, bem entendido!) e se veste dignamente (uma mínima parte, bem entendido!); os homens são vigorosos e as mulheres belas saem nas capas das revistas culturalmente conceituadas. É bem verdade que, neste final de 2001, muitos (milhões!) passam fome nas regiões atrasadas de nosso vastíssimo território brasilês (pesquisem!), nas regiões de seca inclemente, mas, um dia, os beneficiados da sorte olharão por eles. De qualquer maneira, que seja feita a vontade de Deus! Infelizmente, neste Agorá, nesta nossa Praça, onde, segundo o deífico Poeta Chico Buarque, desde eras imemoriais passaram, passam e, por certo!, ainda passarão festivas bandas, cantando coisas de amor, neste minuto-mito de nossa realidade, não há quomodo pretender perfeição celestial em nosso Paraíso. Neste anno de 2001, no Brasil Varonil, há muitos desempregados (pesquisem!), heróicos brasileses que vivem em condições de extrema miséria. Mas, Deus é brasilês e, de vez em quando, acontece o inesperado: alguns, entre muitos, enviam cartinhas dolorosas aos animadores de programas de televisão, revelando seus infortúnios, e são sorteados, e depois vão aos programas, e ganham cestas de alimentação por um anno, casa mobiliada, automóvel, plano de saúde por um anno, assistência odontológica por um anno, vestuário completo (comprado nas mais famosas lojas dos grandes Shoppings de nossas mais importantes urbes). Acreditem! Por aqui, há umas poucas pessoas riquíssimas e, às vezes, seus corações se enchem de compaixão por uns poucos mais pobres! São milhares e milhares de pobres brasileses, no entanto, somente uns poucos são agraciados pela Sorte Benfazeja. Os que foram sorteados na Roleta da Sorte! No esperado dia de glória, para os incríveis assinalados da Boa Sorte, a comoção é geral. A Grande Sorte sempre comparece nas tevês aos domingos, buscando a aceitação dos telespectadores. Hoje, por exemplo, à tarde, com os olhos marejados, estarei assistindo, pela televisão, confortavelmente instalada em minha macia poltrona de cor dourada (apesar do minguado salário de sofressora), os programas que se esmeram em proporcionar a estes desvalidos um pouco de conforto vital, mesmo que seja instantâneo. Quero deixar claro, aos meus Amigos do Futuro, que não me coloco contra os programas televisivos que assim agem. Ao lado da disputa pela atenção do telespectador, existe uma grave revelação, em outras palavras, esses programas conseguem mostrar nitidamente (para aqueles espectadores-eleitos, aqueles que sabem avaliar criticamente as mensagens subentendidas) o ponto – que não seja irreversível – de miséria e abandono que atinge a maior parte da população brasilesa neste final do anno de 2001. Mas, não se impressionem, meus Amigos do Futuro Sem-Muro!, olhando para os lados, observando a realidade circundante, repensando o Mundo já Globalizado, aqui ainda é um lugar maravilhoso. Existe, por acá, o chamado jeitinho brasilês, e, assim, graças a esse jeitinho, vamos vivendo quomodo Deus quer.

Por ora, sem mais notícias, despeço-me com um carinhoso e caloroso aperto de mão transtemporal.

ODISSÉIA MARIA, filha genuína de Antônio Aquileu e Jane Briseis, neta, per lado paterno, dos mitológicos José de Sousa Peleu e Antoniña de Tetis, e, per lado materno, dos inigualáveis Emiliano de Brises e Justiniana de Ogíges, descendentes — os meus dois troncos ancestrais — de imemoriais caçadores de Onças Pintadas e Jaguatiricas Noturnas de Minas Gerais, uma região mitológica localizada na parte Leste do Brasil Varonil.

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